Quando Gregório XVI é eleito, a 2 de fevereiro de 1831, junto da Santa Sé estão presentes representantes das duas fações (liberais e absolutistas) que não deixam de pressionar o novo pontífice de acordo com as suas pretensões. E, a 5 de agosto desse mesmo ano, o Santo Padre expede a Constituição apostólica Sollicitudo ecclesiarum onde, abstendo-se de se pronunciar sobre os aspetos da política portuguesa, justifica eclesialmente o restabelecimento das relações entre a Santa Sé e o Governo de D. Miguel: “Nós unicamente fazemos diligências pelas coisas que são de Cristo, como único fim a que tendem Nossos desígnios, conservando incessantemente sob os Nossos olhos o que mais pode ser conducente à felicidade espiritual e eterna das nações” (BIKER 1879: 47-55).

Quando a Quádrupla Aliança (um tratado internacional assinado entre o Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda, a França, o Reino de Espanha e o Reino de Portugal em 22 de abril de 1834, pelo qual os quatro Estados se comprometeram a expulsar de Portugal o infante português D. Miguel e o infante espanhol D. Carlos de Borbón), ao serviço da Maçonaria, conseguiu arrojá-lo do Trono, o Senhor Dom Miguel foi para Roma, onde foi recebido nos braços do Papa, e onde continuou a receber todas as demonstrações devidas à Realeza, e que já se não podiam dizer tributadas ao fato, mas só ao direito.

O papa Gregório XVI, no consistório do dia 1 de agosto de 1834, terá apresentado D. Miguel como “o rei mais Católico que tenho em toda a Cristandade” (apud CAMPOS 1932: 25).

A intolerância do Sumo Pontífice para com as políticas liberais e maçónicas reforça a ação da Igreja Católica Romana contra as novas ideologias, como evidenciam alguns documentos pontifícios: em 24 de maio de 1829, do Papa Pio VIII, a Carta encíclica Traditi Humilitati; em 25 de março de 1830, a Carta apostólica Litteris Altero; em 15 de agosto de 1832, a Encíclica Mirari Vos, de Gregório XVI.

Assim, a Igreja Católica orientava o seu rebanho no sentido de que a vida que ela inspira é incompatível com o liberalismo, ligado muitas vezes a alguns preceitos como, por exemplo, a separação entre Estado e Igreja, sendo que a aliança entre a religião e a monarquia só sairia fortalecida de modo efetivo pela cooperação entre ambas as instituições que as representam. Para combater esta onda, o papa Gregório XVI iniciava a Encíclica Mirari Vos, condenando os “males atuais”.

A ideologia política miguelista era baseada no pressuposto segundo o qual a religião católica “segura os Tronos dos Imperantes” e o monarca D. Miguel “mantém a tranquilidade pública; contém os povos nos seus deveres, e abate pela raiz as comoções irreligiosas, e antipolíticas dos ferozes ateístas e desorganizadores de toda a ordem social” (LOUSADA 1987: 132-133).

No contexto político interno, o miguelismo foi também suportado pelo reforço dos conceitos e ideais do tradicionalismo político e doutrinário. Assim, entre 1823 e 1834, surge uma frente de ação contrarrevolucionária, com personagens do regime miguelista, conservadores e panfletários, como Faustino José de Madre Deus (1773-1833), Frei Fortunato de São Boaventura (1777-1844), padre José Agostinho de Macedo (1761-1831) ou António Joaquim de Gouveia Pinto (1777-1833), que espalharam a “apologia” do regime, lutando contra a maçonaria, na defesa firme da Tradição.

Com os ventos europeus favoráveis, em Portugal são convocadas as Cortes à maneira antiga, e D. Miguel é proclamado pelos três estados do reino rei absoluto. Para segurar o seu Trono, D. Miguel chama novamente os jesuítas:

Don Miguel n’ignorait pas la popularité dont, après soixante dix ans d’exil, le nom des Jésuites jouissait encore sur les rives du Tage. Son trône était mal affermi, il pensa qu’en rendant a ses sujets les apôtres que Pombal leur avait arrachés, il ferait un acte aussi agréable qu’utile à sa patrie (CRÉTINEAU-JOLY 1858: 359).

Nesse sentido, o Padre Delvaux, responsável da missão portuguesa da Companhia de Jesus em Portugal, sentia que a defesa dos valores tradicionais era uma prioridade, mostrando, ele próprio, “peu d’estime pour les idées dites modernes, et beaucoup moins encore pour le libéralisme” (CARAYON 1863: XI).