GARCIA MORENO E SEU AMOR A CRISTO CRUCIFICADO

O presidente do Equador teve uma grande devoção pela Cruz de Cristo e como se verá adiante, desejava alcançar o que ela simboliza: o martírio. Existe em Gabriel Garcia Moreno, nos últimos anos da sua vida, uma estranha ambição: a de sofrer e morrer por Cristo. Existe esse desejo extraordinariamente raro nos cristãos mais virtuosos, que só é próprio dos Santos.Este desejo de dar a vida por Cristo és, sem dúvida, o que infunde em Gabriel Garcia Moreno sua honrosa devoção pela Cruz. Por essa devoção ele ama tanto a Pio IX, a quem ele considera, por ter perdido os seus estados pontifícios, recebido humilhações e viver como prisioneiro no Vaticano. Recordou o lema que se aplica a este grande papa: Crux de Cruce, ou seja, a cruz que vem da Cruz. A cruz é o símbolo do sofrimento e do martírio.Nela morreu Nosso Senhor Jesus Cristo. Como Gabriel Garcia Moreno poderia não amá-la? E como não aspirá-la o presidente Católico por excelência, um católico que sentiu a Paixão de Cristo? Ninguém entre os presidentes, tem feito pela Igreja e por Cristo, no mundo inteiro, o que fez o presidente do Equador. Sabia que a sua obra, que era Católica, consequentemente atraía o ódio dos inimigos de Cristo. E sabia que morrendo pela Santa Igreja e por Cristo, ele completaria essa obra. Não somente ganharia muitas almas para Cristo na América, mas no mundo inteiro. Por isto, ele desejava derramar o seu sangue. Não era “só” a sua salvação que ele procurava, a reparação dos seus grandes pecados, o perdão de Deus pela morte de Borja, pelos fuzilados de Jambelí, mas a salvação da Igreja na América e o Reinado de Cristo nos corações.Por aqueles dias do mês de abril de 1874, realizou-se em Quito (capital do Equador) uma missão presidida pelos padres redentoristas. Ao seu final, Gabriel Garcia Moreno iria dar diante dos equatorianos e perante o mundo inteiro, um magnífico testemunho do seu amor pela Cruz. Seria um evento retirado da Idade Média, cujo protagonista poderia ter sido São Luís (Luís IX) rei da França, São Fernando rei de Castela ou Godofredo de Bouillon. Porém estamos em Quito, na sua praça maior, com os seus velhos casarões coloniais e sua magnífica Catedral. A Igreja cheia de competência, ali se encontrava o Presidente, os seus ministros, também numerosos nobres, estudantes, trabalhadores e índios, todos unidos pela fé em comum. Como recordação da missão, os padres – redentoristas – haviam presenteado a cidade com uma enorme cruz, de seis metros de comprimento, tomada em bloco e sem cortes de uma única árvore, que seria levada em procissão pelas ruas da cidade, para finalmente ser entronizada na Catedral.Um dos missionários, o Padre Luiz Lopez pronunciou diante dos presentes uma alocução. Recordou que a Redenção nos veio através da Cruz, prosseguiu dizendo, que agora ao seguir com ela pelas ruas de Quito em procissão, o triunfo de Cristo nosso Redentor estava sendo recordado. Acrescentou, que séculos atrás, o imperador Heráclio com os pés descalços e vestido de plebeu, havia carregado sobre as suas costas a Cruz do Calvário, aquela mesma Cruz que havia morrido Nosso Senhor Jesus Cristo, e que após ter sido capturada pelos persas, acabara de ser devolvida ao Império Cristão.Em seguida o missionário voltou-se para o local em que o então presidente Gabriel Garcia Moreno estava sentado, e com uma solene e compassada voz disse: “Assim eram antigamente os Reis e os Imperadores do mundo: crentes e fervorosos. Respeitavam as leis divinas e não se envergonhavam do seu Deus, embora fosse um Deus crucificado. Mas agora já não existe nem sombra daqueles magistrados. Em seu lugar temos reis de baralho e presidentes de repúblicas de papel”. Não podendo continuar falando o orador, pois imediatamente sua frase foi interrompida pela intervenção de Gabriel Garcia Moreno, que pondo-se de pé e estendendo o seu braço para o pregador, com forte e sonora voz lhe disse: Padre Lopez, você mente! Eu, presidente desta República, não me envergonho de Cristo Crucificado, eu também carregarei a cruz sobre os meus ombros.Ali estava uma enorme cruz que “aguardava” para ser carregada pelos fiéis. De repente, para surpresa de todos os que estavam presentes: “Que irá fazer o presidente república?” Aproxima-se da cruz e deseja levá-la sobre os seus ombros. Os olhos de todos os assistentes arregalaram-se de espanto. Alguns enchem os olhos de lágrimas pela tamanha emoção. A voz se difunde no local, mas à medida que a procissão começa, as pessoas vão à praça, cria-se uma multidão como raras vezes havia-se visto em Quito.E então a cidade assiste ao mais extraordinário dos espetáculos: o doutor Gabriel Garcia Moreno, o ex-reitor da universidade, o general e chefe de exército, o escritor, o sábio, o legislador, o presidente da república, começou a caminhar lentamente, levando sobre seus ombros, a Cruz em honra a Nosso Senhor Jesus Cristo, pelas ruas atônitas e comovidas da velha capital. E o povo lhe segue, estupefato, cheio de lágrimas, sem acreditar em seus próprios olhos. O ministro do interior lhe ajuda.Disse um de seus inimigos – acreditando ridicularizar o então presidente – que naquela imitação da Via Crucis, o presidente tem um Cirineu e que em certa parte do caminho, uma mulher que ao vê-lo agoniado e suado, lhe oferecerá uma xícara de caldo. Longe de ridicularizá-lo, o engrandece com isto. Ele mesmo vem a ser um outro Cristo, um imitador do Filho da Virgem Maria. Para ele era uma honra carregar a cruz, e apesar de não morrer crucificado, talvez ele já soubesse, pela sua brilhante percepção que suportaria por Cristo um martírio. E lá vai o presidente da República, com a cruz nas costas, vai entre orações e lágrimas, aos olhares com expressões de assombro e admiração.Todos compreenderam, ou acabarão por compreender um ano mais tarde, o significado do que estão presenciando. E lá vai pelas ruas de Quito, enquanto os sinos são alçados em voo, diante das montanhas gigantescas com a Cruz de Cristo Jesus sobre seus ombros, em um sublime ato de humildade e de fé, o presidente da república, o doutor Gabriel Garcia Moreno, convertido em outro Cristo. Ao inteirar-se desse feito, os maçons da Europa publicaram em um livro a seguinte expressão: “Quando soubemos que este homem havia levado em procissão uma cruz em Quito, descobrimos que já havia chegado ao limite e decretamos a sua morte”.Para um religioso que confidencialmente lhe relatava quanto sofria da parte de seus inimigos, lhe consolou dizendo: Compadeço vossas penas, porém haveis tido magnífica ocasião de juntar tesouro para a eternidade. Os golpes que lhes são dados parecem menos duros, se os comparar com os que eu estou recebendo todos os dias. Faça como eu, ponha os ultrajes aos pés da cruz, e peça ao Bom Deus que perdoe os culpados. Peça que lhe dê bastante força, não só para fazer o bem aos que derramam sobre ti essas palavras e por escreverem as torrentes de ódio que guardam nos seus corações, mas para regozijar-se diante de Deus por ter que sofrer algo em união com Nosso Senhor.Gabriel Garcia Moreno tinha a certeza de que sua morte já havia sido decretada pelos seus inimigos, porém isso não lhe causa medo. Sabia que entre esses inimigos encontrava-se a maçonaria, que o considerava como o homem do sobrenatural, o homem de Cristo. Por isso não lhe causava desgosto a perspectiva de sua morte. Pouco antes de cair apunhalado sob seus homicidas, escreveu para um amigo íntimo que estava na Europa: “Vou ser assassinado. Estou feliz de morrer pela santa Fé, nos veremos no céu.” Dias atrás, numa carta ao Papa Pio IX informou-lhe que as lojas maçônicas dos países vizinhos, instigadas pelas da Alemanha, procuravam “sigilosamente” fazê-lo desaparecer. Por isso, disse-lhe, “necessito, mais do que nunca, da proteção divina para viver e morrer em defesa da nossa Santa Religião e desta pequena república. E acrescenta: “Que fortuna para mim, Santíssimo Padre, a de ser odiado e caluniado por causa de nosso Divino Redentor! E que felicidade tão imensa seria para mim, se vossa bênção me chegasse do Céu para derramar meu sangue por Ele, que sendo Deus, quis derramar o Seu sangue na Cruz, por nós”!Chega o dia 6 de agosto de 1875, Gabriel Garcia Moreno comunga o Corpo de Nosso Senhor Jesus Cristo na Santa Eucaristia e adora o Santíssimo Sacramento, neste mesmo dia antes de ingressar no palácio presidencial, é vitimado através de facãozadas, punhaladas e tiros, o presidente quase não consegue dizer a sua célebre frase como testemunho de sua Fé: “Deus Não Morre”. É levado a Catedral de Quito onde recebe os últimos auxílios da religião. Perdoa seus inimigos e morre na paz do Senhor no Altar de Nossa Senhora – Virgem – das Dores, aos pés da grande cruz que ele mesmo levou sobre seus ombros pelas ruas de Quito um ano atrás. Ao examinarem o seu cadáver, vulnerado por quatorze facãozadas/punhaladas e seis tiros, encontraram sobre seu peito uma relíquia da Cruz de Cristo, o escapulário da Paixão e do Sagrado Coração, e um rosário com a medalha de Pio IX. A efígie deste papa estava manchada em sangue, simbolizando desta maneira tão comovedora e íntima amizade que os havia unido no comum amor pela Santa Igreja. Igualmente foi encontrado em seu bolso a Imitação de Cristo por Tomás de Kempis com anotações diárias. Na última página estava escrito com lápis, daquele mesmo dia, três linhas que escreverá em toda a sua extensão: “Senhor meu Jesus Cristo, dá-me amor e humildade, e faça-me conhecer o que hoje devo fazer em vosso serviço”. Em resposta, o Bom Deus havia pedido-lhe o seu sangue e ele derramou, como último ato de seu serviço, “por aquele que sendo Deus, quis derramar o Seu sangue na Cruz por nós”.