GABRIEL GARCIA MORENO: O PRESIDENTE EUCARÍSTICO
O homem inflexível diante dos tiranos, dobrava os joelhos diante de Deus com a simplicidade de uma criança. Havia passado seus primeiros anos, na mais terna devoção, com a ideia de consagrar-se ao serviço do Altar. Durante as férias que costumava passar em Monte Cristo, na casa de seu irmão, pároco (curador de almas) desta cidade, não era visto mais que na Igreja, rezando com fervor. O restante do tempo ele passava em seu quarto entre os livros. Se as primeiras tempestades da vida pública detiveram um pouco seus arranques até Deus, temos visto como se voltou para o Bom Deus com as provações do desterro. Desde então não cessou de avançar na vida espiritual.
Um professor alemão da Escola Politécnica, que durante os longos anos que passou em Quito, teve a oportunidade de tratar com intimidade o devoto presidente, e até de visitar-lhe em sua fazenda, onde costumava ir de vez em quando para tirar um dia de descanso, não podia reprimir sua admiração ao recordar estas virtudes. “Sempre estava me edificando, escreve, pela sua bondade e amabilidade encantadora, que sem dificuldade era grande, e sobretudo, por sua profunda piedade. Pela manhã, na hora da Missa, ele ia a sua capela, ele mesmo preparava os ornamentos e ajudava na Santa Missa na presença dos seus familiares e dos habitantes do lugar. Se hes tivessem visto com sua elevada estatura, suas feições pronunciadas, seus cabelos brancos e sua postura militar; se tivessem tido a oportunidade de ler como nós, naquela fisionomia o Temor de Deus, a Fé Viva, a Esperança Firme e a Caridade Ardente que seu coração estava cheio, entenderias o respeito que a todos davam na presença deste homem do Senhor”.
Exigindo-se em um jubileu, a assistência em três procissões para ganhar a indulgência, fez-se presente mesmo que em atenção as suas muitas ocupações podia legitimamente solicitar uma substituição destas obras: — “Livrai-me Deus! contestou; eu sou um cristão como qualquer outro.” Participou, pois, das três procissões com a sua esposa e seu filho, com a cabeça descoberta, e sem guarda-sol, apesar da quentura de um dia ensolarado. Deu mais ou menos a mesma resposta, ao superior de uma ordem religiosa, que para evitar que o presidente caminhasse todas as semanas por quinze minutos, ofereceu-lhe enviar o seu confessor. “Meu padre – contestou – é o pecador que tem que procurar o juiz, e não o juiz que deve andar procurando o pecador.”
Sua piedade, cume da sua confiança e amor, levava-lhe a todas as devoções autorizadas pela Igreja, e em primeiro lugar, ao Santíssimo Sacramento, privilégio do seu culto. Fazia-lhe frequentes visitas, permanecendo prostrado diante do altar, com um sentimento de profunda adoração. Era sua alegria poder comungar todos os domingos, e ainda durante a semana, se houvesse alguma festividade litúrgica. Quando o santo viático era levado para um enfermo, o presidente tinha muita honra em escoltar o seu Santo Deus com uma vela nas mãos, no meio do seu povo. Nas procissões de Corpus Christi, via-se o Chefe de Estado com seu belo uniforme de Major-General com todas as suas condecorações, tomar a bandeira e preceder o palio, como um servo que vai anunciando o seu Mestre. Os demais oficiais cediam uns aos outros as varas do palio, ou buscavam alguma sombra nas paredes, mas o presidente mantinha-se firme durante a procissão, no meio da rua, ignorando o sol para não afastar-se do Santíssimo Sacramento. Suplicaram-lhe um dia que se cobrisse para evitar uma insolação, porém imediatamente protestou, dizendo que não iria cobrir a cabeça diante de seu Deus.
Quando ele rezava nas igrejas, era visto tão absorvido na oração, que às vezes falava em voz alta, sem reparar nele mesmo. Mais de uma vez o ouviram exclamar: “Senhor, salva o Equador!”. O segredo da sua vida de estadista foi, como havia se comprometido: “Conservar-se sempre na presença de Deus”. Várias pessoas que entraram em seu escritório contam que algumas vezes o encontraram ajoelhado diante de um crucifixo. Era conhecida a sua devoção a Cruz. Ao ser surpreendido, levantava-se sorrindo, um pouco encabulado, pedia desculpas por não ter percebido a presença do visitante ou do empregado.
Quando encontrava-se diante de um sacerdote, sua humildade tomava a forma de reverência. Numa certa ocasião, um padre capuchinho, que estava de passagem por Quito, foi visitar-lhe; ao vê-lo, tirou o chapéu. “Cubra-se, pelo amor de Deus, padre”, lhe disse, enquanto ele descobria a sua cabeça. O padre replicou: “Não posso cobrir-me diante do presidente da República”. Ao que García Moreno contestou: “Padre, o que é um Chefe de Estado diante de um ministro de Deus?”.
Em uma missão, o Padre Luis López o observou ao final da fila dos homens para se confessar, e foi diretamente ao presidente e lhe disse: “Exmo. presidente, sem dúvida a sua excelência tem ocupações urgentes de governo. Eu posso atendê-lo de imediato para a confissão; “Padre López, contestou o Chefe de Estado, tenho que dar exemplo ao meu povo, portanto devo respeitar a vez”. O missionário, edificado e cheio de admiração, voltou para o seu confessionário; enquanto que o Chefe de Estado esperou pacientemente até que chegasse sua vez para a Confissão. No dia seguinte, não pôde Gabriel García Moreno conter as lágrimas de alegria, ao ver uma espessa multidão de homens aproximando-se da Mesa da Comunhão, depois de muitos anos sem fazê-lo, haviam se confessado e preparavam-se para comungar o Corpo de Nosso Senhor Jesus Cristo. Eufórico saiu de casa naquela tarde, com o objetivo de presidir a clausura daquela missão.
Mas onde se viu a sua maior CONFIANÇA e AMOR por Nosso Senhor Sacramentado, foi no dia 25 de março de 1874, dia que Consagrou sua Pátria ao Sagrado Coração de Jesus, na Missa da Consagração oficializada pelo Arcebispo de Quito, Monsenhor Ignacio Checa y Barba, depois do Santo Evangelho – no sermão/homilia – subiu ao púlpito o Cônego Rafael Gonzales Calixto e falou do significado da Consagração que se faria dentro de uma hora, após isto, a Santa Missa é retomada, dada a comunhão ao Presidente e a multidão presente.
Terminado o Santo Sacrifício da Missa, o Santíssimo Sacramento foi exposto, e se deu a leitura da fórmula da Consagração redigida pelo padre jesuíta Manuel Proaño, a frente estão Mons. Ignacio Checa y Barba representando o clero e o presidente Gabriel García Moreno representando o Estado, ambos recitam o texto, e o povo repete as palavras daquela oração histórica que começa assim: “Senhor, este é o seu povo. Sempre meu Jesus, ele te reconhecerá por seu Deus”. Para tal ato, Gabriel García Moreno mandou pintar um quadro do Coração de Jesus de meio corpo, com olhar suplicante ao seu Pai Celeste, com os raios de Seu Coração iluminando o mundo especialmente o Equador que foi consagrado. Este quadro foi uma obra do pintor Rafael Salas que o pintou em Roma e teve a benção do Papa Pio IX, foi utilizado na Consagração do Equador ao Sagrado Coração de Jesus no dia 25 de março de 1874, sendo o primeiro país do mundo a fazê-la.
No dia 6 de agosto de 1875 – dia da Transfiguração do Senhor – às seis da manhã, como de costume o presidente se dirigiu para a igreja de São Domingos para assistir a Santa Missa. Era a primeira sexta-feira do mês, especialmente dedicada ao Sagrado Coração de Jesus. Como outros muitos fiéis, o presidente aproximou-se da Sagrada Mesa da Comunhão, e recebeu a Santa Eucaristia, sem dúvida como viático para a sua última viagem; porque depois de tantas ameaças e advertências recebidas de todos os lados, não podia ignorar que se encontrava em perigo de morte. Sem dúvida alguma, por isso prolongou a sua ação de graças até as oito da manhã.
Antes de entrar no Palácio de Carondelet, o presidente quis adorar o Santíssimo Sacramento que estava exposto na Catedral. Durante um bom tempo ficou ajoelhado nos ladrilhos da igreja, absorvido no mais profundo recolhimento. Como ao aproximar das trevas, os objetos criados desaparecem e a natureza se repousa em profunda calma, o Bom Deus naquele momento supremo, afastando da alma de seu servo toda a memória dos seres criados, atrasou-lhe docemente o repouso – do presidente – na união celeste.
E a teria prolongado ainda mais, se um homem desconhecido não tivesse se aproximado e avisado-lhe que o estavam esperando para um negócio muito urgente. O Presidente levantou-se imediatamente, saiu, subiu as escadas do Palácio, e já avançava até a porta, quando um homem de apelido “Rayo” que o vinha seguindo, sacou debaixo da sua capa um facão, golpeando-lhe pelas costas. Rayo e o seu grupo de assassinos mercenários atacaram-no, ferindo-lhe de morte com 14 golpes de facão e 6 tiros de armas de fogo. Em todo este transe, o presidente Gabriel Garcia Moreno pôde dizer a sua última frase como testemunho da Fé Católica: “DIOS NO MUERE” (DEUS NÃO MORRE).
Imediatamente foi levado para a Catedral de Quito diante do altar de Nossa Senhora das Dores, poucos minutos depois de receber os Santos Sacramentos, falece, cumprindo-se assim seu desejo que manifestou ao Papa Pio IX em uma carta: “Agora que as lojas maçônicas dos países vizinhos, instigadas pelas da Alemanha, vomitam contra mim toda espécie de injúrias atrozes e calúnias horríveis, procurando furtivamente os meios para me assassinar, necessito mais do que nunca da proteção Divina para viver e morrer em defesa de nossa Santa Religião e desta pequena República … Que fortuna para mim, Santíssimo Padre, a de ser odiado e caluniado por causa de Nosso Divino Redentor, e que felicidade tão imensa para mim, se vossa bênção me alcançar do céu para derramar meu sangue por Aquele que sendo Deus, quis derramar o Seu Santíssimo Sangue na Cruz por nós!”.
Assim foi que Gabriel Garcia Moreno entregou a sua vida, tornando-se mártir do Sagrado Coração de Jesus e em modelo para outros cristãos. Poucos conhecem a história deste político Católico. Gabriel García Moreno soube simplesmente acolher o Evangelho na sua vida, e pela sua Fé serviu a sua Pátria. Sua morte se converteu em um testemunho de fidelidade à Nosso Senhor Jesus Cristo e da Sua Santa Igreja, e um exemplo para que outros homens e mulheres, dispostos a servir generosamente seu povo como políticos Católicos, estejam preparados para a graça suprema do martírio.
CRÉDITOS
Gabriel Garcia Moreno
(Carlos Guerrero, historiador Garciano)